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Com imagens inéditas, plataforma virtual permite navegar pelo Rio Doce

© Fundação Renova/Divulgação

Uma plataforma lançada hoje (14) permite que qualquer pessoa percorra de forma virtual, com uma visão de 360 graus, os leitos do Rio Gualaxo do Norte, do Rio Carmo e do Rio Doce. O passeio também permite acessar dados relacionados ao monitoramento da qualidade da água dos três mananciais, que foram afetados após o rompimento da barragem da mineradora Samarco, ocorrido em novembro de 2015 na cidade de Mariana (MG).


Com imagens inéditas, plataforma virtual permite navegar pelo Rio Doce.

Com imagens inéditas, plataforma virtual permite navegar pelo Rio Doce. – Fundação Renova/Divulgação

A iniciativa é da Fundação Renova, entidade criada para reparar os danos causados na tragédia. A plataforma é resultado de um mapeamento imersivo realizado por meio de uma expedição pela bacia do Rio Doce. Entre novembro de 2020 e janeiro de 2021, foram percorridos cerca de 600 quilômetros desde Mariana (MG) até a foz, em Linhares (ES). Com uso de câmeras e drones, foram captados mais de 1,5 milhão de conteúdos midiáticos entre sons, fotos e vídeos.

O usuário pode navegar ouvindo pássaros locais e assistir minidocumentários com moradores dos arredores do Rio Doce. Também é possível ver imagens inéditas da fauna e da flora como o registro de duas onças pardas caminhando tranquilamente em uma área de mata próxima a Aimorés (MG). Parte do conteúdo também foi agregado à plataforma internacional Google Street View.


Onça parda é flagrada na expedição – Fundação Renova/Divulgação

Na tragédia, uma onda de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos causou 19 mortes, destruiu comunidades inteiras e levou poluição para dezenas de cidades na bacia do Rio Doce. A Fundação Renova foi criada conforme um acordo entre a Samarco, suas acionistas Vale e BHP Billiton, o governo federal e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. A entidade é responsável por gerir mais de 40 programas. Todas as iniciativas são financiadas com recursos das três mineradoras.

Embora iniciativas de diferentes programas sejam apresentadas na plataforma, a maior parte dos dados que ela reúne são produzidos no âmbito do programa voltado para o monitoramento sistemático de água e sedimento. São informações que já vinham sendo disponibilizadas em um painel online e agora também poderão ser obtidas a partir desse mapa mais interativo.

O programa de monitoramento das águas da bacia foi iniciado em agosto de 2017, acompanhado também por órgãos ambientais de Minas Gerais, que já faziam análises anteriormente. A Fundação Renova reúne medições em 92 pontos, dos quais 22 contam com estações automáticas que geram informações em tempo real. Cerca de 80 parâmetros físicos, químicos e biológicos são avaliados. Um dos últimos documentos disponíveis é um relatório divulgado em fevereiro que concentra os dados de novembro. Em 27 dos 29 pontos avaliados foram encontrados parâmetros acima dos limites previstos nas normas ambientais.

A concentração de manganês total foi considerada anormal em 17 deles. Há ainda violações de parâmetros de ferro dissolvido em 14 pontos e de alumínio dissolvido em 6. Segundo o documento, as variações são típicas de épocas de chuva. “Os metais acima estão naturalmente presentes na bacia do Rio Doce e também fazem parte do rejeito da barragem de Fundão”, acrescenta o relatório.

A turbidez foi registrada além dos limites em 11 pontos, o que também é apontado como reflexo do período chuvoso. O documento considera ainda que a classificação média e ruim do índice de qualidade da água é influenciada pelos parâmetros referentes à bactéria Escherichia Coli, causadora de problemas intestinais. Sua presença em 19 dos 29 pontos avaliados indica problemas com o lançamento de esgoto não tratado.

Na zona costeira do Espírito Santo, o último informe trimestral foi divulgado há dois meses e é referente ao período entre julho e setembro de 2020. No mar, próximo à foz do Rio Doce, 14 pontos foram monitorados. Nenhum deles registrou parâmetros acima do permitido para as concentrações metais. Porém, em todos os pontos foram observadas alterações além do limite legal para carbono orgânico total e, em oito deles, havia presença da bactéria Escherichia Coli.

Segundo Brígida Maioli, especialista da Fundação Renova responsável pelo programa, a situação na bacia está próxima ao que se observava antes da tragédia. “Na média histórica, já tínhamos antes do rompimento parâmetros acima da legislação no período chuvoso. O que podemos constatar com quase quatro anos de monitoramento é que os parâmetros estão tendo uma redução gradativa ao longo do tempo e já estão retomando as concentrações anteriores”, avalia.

Ela afirma ainda que a qualidade da água do Rio Doce já era comprometida principalmente pelo lançamento de esgotos não tratados e também pela erosão, em decorrência do desmatamento. “Por isso a turbidez se eleva tanto. Quando chove, sedimentos da área que não possui cobertura vegetal vão parar no Rio Doce”.

Riscos

Os órgão ambientais, porém, mantêm restrições que foram impostas após a tragédia. A pesca na bacia, por exemplo, segue restrita. Além disso, documentos disponibilizados pelo Ministério Público Federal (MPF) em setembro do ano passado colocam em questão a falta de transparência das informações sobre a qualidade das águas. Trata-se de relatórios de auditoria assinados pela Ramboll, uma das empresas responsáveis por periciar as ações de reparação conforme acordo negociado pelo MPF com as mineradoras.

De acordo com os documentos, os resultados não têm sido apresentados de forma clara e objetiva, com uma linguagem acessível aos atingidos e a todos os usuários das águas da região, não havendo também alertas sobre eventuais riscos de uso e consumo. A Ramboll avalia que falta clareza sobre as possibilidades de uso na pesca, aquicultura, irrigação, dessedentação de animais e recreação. Essas informações não constam na nova plataforma.

“Os dados da qualidade das águas levantados nos monitoramentos e seus usos preponderantes, principalmente aqueles das regiões atingidas pelo desastre, possuem potencial para serem apresentados em linguagem clara e acessível, tanto nas comunicações dos órgãos de gestão de recursos hídricos quanto nas da Fundação Renova”, acrescenta o relatório.

De acordo com Juliana Bedoya, líder de programas socioambientais da Fundação Renova, há uma melhora significativa e consistente da qualidade da água ao longo dos anos, que seria resultado do trabalho de reparação. “As ações se desenvolvem não só na calha do rio como também na proteção e recuperação das margens. Como já ocorria antes do rompimento, a água do Rio Doce não deve ser consumida em estado bruto, sem tratamento. Mas os nossos dados de monitoramento mostram que ela está apta para uso humano, podendo ser consumida após um tratamento convencional”, diz.

A falta de confiança dos atingidos na Fundação Renova, porém, tem resultado numa mobilização por estudos paralelos. Eles questionam a falta da entidade frente às mineradoras. Esse foi também um dos motivos elencados pelo Ministério Público de Minas Gerais para pedir judicialmente a extinção da Fundação Renova.

No fim de 2019, a Cáritas e a Aedas, duas das entidades escolhidas pelas próprias vítimas para lhes prestar assessoria técnica, apresentaram um estudo realizado por uma equipe multidisciplinar do Laboratório de Educação Ambiental, Arquitetura, Urbanismo, Engenharias e Pesquisa para a Sustentabilidade (LEA-Auepas) da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop). Em amostras de água, chamaram atenção dos pesquisadores concentrações de ferro, manganês, níquel e, eventualmente, de chumbo.

Edição: Aline Leal

Fonte: Léo Rodrigues – Repórter da Agência Brasil – Rio de Janeiro
Crédito de imagem: © Fundação Renova/Divulgação

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