A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino de suspender repasses de emendas parlamentares a nove municípios brasileiros não deve ter efeitos práticos nos cofres das duas cidades do estado do Rio afetadas: São João de Meriti e a capital.
O RJ2 apurou que as emendas, que foram investigadas em uma auditoria da Controladoria Geral da União (CGU), já foram integralmente pagas pela União aos dois municípios.
Ao todo, foram destinados R$ 34,6 milhões para a cidade de São João de Meriti, em emendas aprovadas no ano de 2023. O município do Rio recebeu outros R$ 18,2 milhões. Parte delas tiveram indícios de superfaturamento, segundo a CGU.
Com isso, apesar da decisão de Dino, as duas cidades não serão impactadas pelo bloqueio, que atinge apenas as emendas sob investigação da Controladoria.
‘Emendas PIX’
Emendas individuais de transferência especial, ou emendas PIX, foram criadas em 2019 e ficaram conhecidas assim pela dificuldade na fiscalização dos recursos, uma vez que os valores são transferidos por parlamentares diretamente para estados ou municípios sem a necessidade de apresentação de projeto, convênio ou justificativa – por isso, não há como fiscalizar qual função o dinheiro terá na ponta.
Nos últimos anos, o STF estabeleceu uma série de medidas com o objetivo de aumentar a transparência no uso de recursos federais destinados a estados e municípios por deputados e senadores. Os nove municípios que tiveram os bloqueios não cumpriram, segundo a CGU, requisitos de rastreabilidade e transparência.
As duas cidades do RJ foram selecionadas para a auditoria por estarem entre as 10 que mais receberam recursos via “Emendas PIX” entre 2020 e 2024.
A cidade de São João de Meriti recebeu ao todo R$ 58,3 milhões, o quarto maior volume do país, e o Rio de Janeiro, R$ 50,6 milhões – na sétima colocação.
O que dizem as prefeituras
Em nota, a Prefeitura do Rio informou “que os questionamentos já foram amplamente esclarecidos durante a auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), em que foi demonstrado não haver qualquer irregularidade na utilização desses recursos”.
“A auditoria realizada pela CGU questionou a aquisição de duas portas acústicas para o Teatro Ipanema e uma para o Teatro Ziembinski, que representou menos de 2% do total da emenda.
Vale ressaltar que a formação de preço dos itens seguiu rigorosamente o sistema oficial da Prefeitura (tabela SCO-RIO), elaborado pela Fundação Getúlio Vargas, conforme estabelece o decreto 49.264 de 12 de agosto de 2021. Consultada novamente, a FGV ratificou os valores praticados pela Prefeitura do Rio.
Em relação à suposta duplicidade de pagamento no valor de R$ 119 mil, esclarece-se que ela não ocorreu. Houve um erro material na forma de composição do orçamento, já corrigido, sem qualquer impacto financeiro ou prejuízo à administração municipal.”
Leia a nota de Meriti: “A Prefeitura de São João de Meriti informa que a atual gestão recebeu o município com uma dívida de R$ 1,04 bilhão e que os bloqueios determinados pelo Supremo Tribunal Federal irão impactar de forma significativa o funcionamento de serviços essenciais. É importante destacar que as transferências avaliadas pela auditoria dizem respeito à antiga gestão, referentes ao período de 2020 a 2024. Diante disso, a Procuradoria-Geral do Município já está atuando nos autos para adotar as medidas cabíveis e a administração municipal irá auditar internamente os contratos vigentes que ainda façam parte dessas emendas.”
Os nove municípios que não cumpriram as determinações e terão os recursos suspensos por ordem de Flávio Dino:
Carapicuíba (SP): falhas na formalização de processo licitatório;
São Luiz do Anauá (RR): obras paralisadas, com prazo de vigência terminado;
São João de Meriti (RJ): indicativos de superfaturamento;
Iracema (RR): objetos executados fora das especificações técnicas;
Rio de Janeiro (RJ): indícios de superfaturamento;
Sena Madureira (AC): ausência de documentos que comprovem a entrega do produto;
Camaçari (BA): desvio do objeto da execução do contrato;
Coração de Maria (BA): contratação de empresa sem comprovação de capacidade técnica;
Macapá (AP): indícios de superfaturamento.
Envio dos casos à PF
Na mesma decisão, Flávio Dino determinou o envio, pela CGU à Polícia Federal, do relatório sobre possíveis irregularidades no tratamento de recursos públicos indicados por deputados e senadores.
O ministro ordenou que a PF investigue os casos para apurar supostos desvios, superfaturamentos e favorecimentos de empresas.
“Em 9 dos 10 municípios auditados, constatou-se a ineficiência e inefetividade na aquisição de bens e na execução dos serviços, incluindo indicativo de superfaturamento, de desvio de recursos, de favorecimento de empresas e ausência de comprovação da aquisição de bens, gerando não conformidades que impactaram significativamente na entrega dos objetos originalmente acordados”, diz o relatório da CGU.
Flávio Dino também determinou à CGU que amplie a apuração sobre emendas destinadas a outras localidades “à vista do altíssimo índice de problemas identificados em 9 dos municípios auditados”.
“A continuidade é necessária para separar o joio do trigo, evitar injustiças, possibilitar o exercício pleno do direito de defesa e aplicar as sanções cabíveis após o devido processo legal”, concluiu o magistrado.
Fonte: g1